A MISSÃO
— Mãe, onde está o papai? — Perguntou a criança.
— Seu pai está trabalhando, meu filho.
— Mas, mamãe, é véspera de Natal!
— Eu sei. Mas seu pai é um policial e tem um dever. Infelizmente
foi chamado de última hora para um serviço que apareceu. Bandido nesse país não
tem horário para trabalhar. Agora vamos nos preparar e rezar para que seu pai
consiga chegar a tempo para a ceia de natal.
— Está bem. — Aceitou o menino.
Vera estava preocupada. Seu marido Alfredo era policial há pouco tempo
e trabalhava há alguns meses no DENARC, a Delegacia que trabalha contra o
tráfico de entorpecente. Claro que já tinha sido chamado para trabalhar fora de
hora, mas no Natal era a primeira vez e ainda mais quando tinham recebido uma
denúncia de que iria ter um carregamento grande de drogas no cais. Segundo
Alfredo, um dos informantes da delegacia havia passado essa informação algumas
horas antes e era algo que estavam aguardando com muita ansiedade. Estavam trabalhando
há muito tempo contra uma quadrilha que traficava para o exterior e que a
quantidade de drogas normalmente era muito grande.
E foi isso que deixou Vera apreensiva, pois se era um grande
carregamento, provavelmente haveria bastante criminoso e nenhum estaria disposto
a se entregar facilmente para a Polícia.
No início da noite, o Delegado Borges chamou seus policiais e
preparam a ofensiva, conforme os dados levantados pelo informante.
— Muito bem, pessoal. É o seguinte. O embarque da droga deve
acontecer uma meia hora antes da meia-noite. Escolheram essa hora porque é
muito próxima da ceia de natal e todos estarão em suas casas com as respectivas
famílias.
— Esperto. — Afirmou um dos policiais.
— Exatamente. Mas o que eles não sabem é que nós seremos
parte da ceia deles. Paulo, você leva sua equipe pela parte do mar. O barco do
DENARC está à sua espera totalmente abastecido. Não esqueça de levar o
armamento pesado. Vamos precisar.
— Ok, Delegado.
Paulo e mais cinco policiais começaram a se ajeitar, pegar os
coletes à prova de bala e verificaram as suas pistolas. Nada poderia falhar,
principalmente as armas. Assim que olharam tudo, pegaram as escopetas e fuzis e
foram até o barco da delegacia. Já sabiam onde se posicionar e ficariam
aguardando apenas as ordens do delegado.
— Quanto aos demais, vamos fazer uma varredura do local e
seguir em leque, em duplas. O objetivo é cercar e não dar qualquer chance para
os vagabundos.
— Senhor, a informação está toda correta? Alguém já verificou
o local antes? — Perguntou Alfredo.
— Sim, Alfredo. Nosso informante passou lá horas antes e nos
deu o nome do barco que será embarcado com a droga. Será o Medalhão II. Estará no
píer 3 do cais Santa Marta.
Alfredo acenou com a cabeça, afirmativamente.
Em seguida foi inspecionar a sua pistola .40. Estava tudo em
ordem e vestiu o colete. Naquele momento tudo o que ele pensava, além da missão,
é claro, era em sua esposa Vera e no seu filho de oito anos, o Carlinhos.
— Vai ser mamão com açúcar. — Riu Colares, o seu parceiro da
missão.
Alfredo também riu.
Colares já era policial antigo e tinha muita experiência nesse
tipo de abordagem. Inclusive já tinha recebido algumas medalhas por ser sempre
muito corajoso e ativo. Era sempre um dos primeiros e não dava mole para
bandidos.
Eram uma equipe de quinze policiais mais o delegado,
totalizando oito duplas. Pelo que o informante passara, seria suficiente. Era início
da noite e ainda teriam que ficar de campana no local para dar o flagrante na
droga.
Tudo certo, tudo ajeitado. Armas inspecionadas. Pegaram as
viaturas descaracterizadas e partiram para o cais.
Cerca de 45 minutos depois chegaram ao píer. Esconderam os
carros o máximo que puderam e ficaram esperando. Tudo estava tranquilo.
Demóstenes, um dos policiais (que menos parecia policial) e
Fabiana, uma das poucas agentes da delegacia, saíram da viatura a mando do
delegado e deram uma pequena volta pelo píer. Disfarçadamente, parecendo um
casal de namorados, tinham a missão de localizar o barco e confirmar o local
onde estaria ancorado.
Trinta minutos depois ambos retornaram e deram a notícia.
— Chefe, o barco não está ancorado. — Disse Demóstenes.
— Como assim, não está ancorado? — Alarmou-se Borges.
— Demos uma volta pelo cais e não há nenhum barco com o nome
MEDALHÃO II. Simples assim.
— Alguma coisa está errada.
Borges ficou pensativo e em silêncio amaldiçoou o informante.
Se alguém soube da operação é bem capaz que mudaram o local. Ainda tinham uma
vantagem. Paulo estava no barco e saberia dali se algum barco se aproximasse. Se
o embarque fosse feito realmente naquela noite, e nada dizia o contrário,
justamente por ser noite de natal, ainda teriam chance de pegar os traficantes.
O Delegado Borges detestava traficantes. Sempre que tinha uma
chance de prendê-los ele o fazia. Aprenderam desde cedo que todos os crimes
agiam em volta do tráfico, do mesmo jeito como os planetas orbitam o sol.
Os viciados, aviões e peixes menores, para continuar com sua
dependência, praticavam vários outros delitos: furtos, roubos, agressões,
homicídio e até mesmo Latrocínio (roubo seguido de morte) que é a pena maior de
nosso Código Penal, além de ser crime hediondo. Era da teoria que se extirpasse
o tráfico, os demais crimes diminuiriam, voltariam a ser como antigamente...
inclusive seriam mais controláveis.
Infelizmente o tráfico existia, e era muito grande. Não seria
fácil acabar com esse crime e com os que orbitam à sua volta.
A legislação brasileira também não ajudava. Viciados não eram
presos mais, só pagavam penas alternativas, mas ainda assim com seu vício
financiavam o crime. Os traficantes cada dia estavam mais numerosos e mais
poderosos.
Fora que a sociedade via a Polícia, seja Civil ou Militar,
com olhos diferentes. Não tinham mais respeito. E normalmente culpavam a
polícia por alguma coisa malfeita, invertendo os valores de antigamente.
Esse também era um dos motivos que deixava Borges mais
furioso. Ser taxado pela sociedade como pária. E não como um agente da Lei e
mantenedor da Justiça.
Pouco depois das dez, Paulo, do barco avisou a Borges que
haviam avistado algumas luzes. Era um barco se aproximando, mas diferente do
que sabiam, ele não estava se dirigindo para o cais Santa Marta. O destino era
outro.
Imediatamente o delegado determino que saíssem dos carros e
partissem para o novo cais. As coisas estavam mudando e precisavam ser rápidos para
que não perdessem a operação. E ainda tinham que torcer para que o barco fosse
o mesmo da informação. Paulo estava às escuras e não pode visualizar o nome do
barco escrito em sua lateral.
Com as novas ordens, os policiais partiram então para o outro
cais.
...
fim da primeira parte
ANTONIO HENRIQUE FERNANDES
Autor e Capitão deste Navio Errante.
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