quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

VIAGEM LITERÁRIA - conto O Navio Fantasma - Lendas Marinhas

O NAVIO FANTASMA


Por Antonio Henrique Fernandes





Fernando tinha acabado de ser chamado para trabalhar em um lindo navio de cruzeiro. Um pouco antes de começarem suas férias da faculdade ele fez inscrição para trabalhar durante o período, ganhar um trocado, porque a coisa não estava fácil não. Os livros de medicina eram caros e ele precisava de um bocado deles.

Sua irmã Nanda também fazia faculdade, de Direito, e fez a mesma inscrição, e, para alegria dos dois, foram chamados para o mesmo cruzeiro. Mesmo navio. Mesmo trabalho. Era como tirar férias em família, só que trabalhando.

O único infortúnio é que teriam que embarcar três dias antes do natal. Nesse caso passariam a data natalícia longe da família, porém, o fato de estarem juntos compensava de certa forma a falta dos pais, Seu Geraldo e Dona Armínia.

Fernando tinha conseguido o serviço de tradutor e acompanhante e Nanda seria babá das crianças que precisassem, até porque, dependendo do tipo de cruzeiro, haveria muitas crianças. Esse não era temático, então muito provavelmente teria famílias inteiras. O navio pararia em Punta Del Este, no Uruguai, para a festa natalina, grande sacada da empresa que reservou o cruzeiro marítimo.

Na data marcada, os dois irmãos se despediram de seus pais, no porto de Santos e embarcaram no Navio Mistério do Sul, de uma grande companhia e que fazia rotas para o Uruguai, Argentina e litoral brasileiro.

— Boa viagem a vocês dois, aproveitem bastante e não esqueçam de um cuidar do outro. — Disse o pai, dando um forte abraço nos filhos.

— Pode deixar pai, a gente sabe se cuidar. — Respondeu Fernando.

Ao subirem no navio, foram para as suas cabines, se instalaram e em seguida se apresentaram aos seus superiores.

De posse das regras e do trabalho que fariam a bordo do Mistério do Sul, Fernando e Nanda partiram para iniciar seus serviços. Tinha gente do mundo inteiro, era uma viagem especial, e os serviços de intérprete de Fernando seriam bem utilizados.

Nanda não seria a única babá a bordo, sua supervisora avisara que haveria muitas crianças e então outras babás foram contratadas. E crianças de todas as idades e nacionalidades. Esse era um dos principais critérios para ser contratada por cruzeiros de verão e férias, ter conhecimento de pelo menos o Inglês. E tanto Fernando quanto Nanda eram fluentes na língua. Estudaram muito, o que também ajudaria na faculdade.
O primeiro dia foi de muito trabalho para ambos, pois os passageiros estavam muito encantados com o navio e o que ele podia oferecer. Muitas piscinas, salas de cinema, salas de musculação e ginástica, além de restaurantes, lojas e um cassino.


No terceiro dia, véspera de Natal, o navio logo chegaria a Punta del Este e como era uma data especial, ao invés de seguir para Buenos Aires, ficaria até o amanhecer e depois dos festejos partiria para a capital argentina. Até então tudo ia bem, os irmãos aproveitaram cada minuto dessa viagem, aprendendo, trabalhando e ganhando muitas gorjetas.

Passaram a noite de Natal juntos e com o computador em vídeo conferência para estarem com os pais, afinal, a distância é bastante amenizada quando se tem a tecnologia a seu favor.

No entanto, já na viagem de retorno, logo após passar por Punta del Este, quando estavam em navegação, já bem perto da meia noite, Fernando, em um momento de folga, resolveu passear pelo deck com sua irmã. Nenhum dos dois havia encontrado uma pessoa especial, tão preocupados estavam em trabalhar e ganhar o seu suado dinheirinho. Então, nessa noite estavam passeando juntos pelo deck, em uma noite agradável, quando mais para dentro do Oceano Atlântico, o tempo começou a mudar. Perceberam que havia muitas nuvens se aproximando, mas o que mais chamou a atenção de Fernando, que conhecia um pouco de navegação, era que as nuvens estavam se aproximando contra o vento. O vento não estava tão forte, mas as nuvens mais acima estavam na mesma direção do navio. O céu de Lua Cheia mostrava claramente as poucas nuvens se movendo em direção contrária àquelas que Fernando tinha visto como tempestade.

Aparentemente era uma tempestade marítima se aproximando. Com o navio daquele tamanho, não teriam tanto problema. Claro que se fosse uma das grandes tempestades, o navio iria oscilar, balançar, mas seguiria a viagem... só um Ciclone ou uma super tempestade faria com o que o navio se aproximasse da costa para esperar a passagem do mal tempo.

O certo é que observando melhor para aquele fenômeno, Fernando notou que as nuvens não atingiam uma grande vastidão, parecia bem isolada e tinha, além de raios e trovões, uma espécie de névoa, ou então era muita chuva, que deixava tudo sem visibilidade. Provavelmente era essa segunda alternativa...

O vento ficou mais forte, e Nanda, que estava de gorro, teve que segurar com a mão para que a vestimenta não fosse levada pelo vento.

Não havia muita gente andando pelos decks, até porque era tarde. E como estava frio, o povo estava mesmo era se esquentando ou na danceteria ou no cassino. E fora os irmãos, mais ninguém que estava passeando notou a tempestade iminente.

O pessoal da tripulação que estava na ponte também tinha percebido a tempestade e mudou um pouco a trajetória do navio, tudo para desviar daquelas nuvens. Contudo, Fernando também percebeu que mesmo com o pequeno desvio, as nuvens, também realizaram o mesmo desvio. Ou seja, mantinha rota com o navio. E isso foi bem estranho.

— Nanda, você está vendo o que estou vendo? — Perguntou Fernando à sua irmã, apontando para as nuvens acima deles e para aquela aglomeração de nuvens que se mexia como tempestade próxima.

— Sim. Tem algo que não está batendo. Aquelas nuvens de tempestade está se aproximando mais rápido do que o navio está se movendo... e isso não deveria estar acontecendo, já que o navio está a favor do vento. Além do que eu também vi que o navio fez uma pequena mudança em sua rota, acredito que justamente para evitar aquelas nuvens.

— Exato. Que é estranho, é sim. Mas não me parece perigo à vista.

Mais estranho ainda foi que quando terminaram de falar, como se tivesse ouvido os irmãos, a “tempestade” apressou o passo.

Fernando poderia jurar que entre raios, trovões e nevoeiro, viu um mastro com um cesto na gávea, mas galeões não navegavam há muito tempo. Muito mesmo.

Dentro da ponte, o Capitão Moacir pensou a mesma coisa quando baixou o seu binóculo, após ver exatamente a mesma coisa que Fernando e Nanda.

Repassou o objeto para o seu imediato, Celso, que ao ver aquilo se lembrou de muitas histórias que havia ouvido e dos livros que havia lido.

— Capitão, sei que vai me achar louco, e realmente parece loucura, mas ouvi muitas histórias de um navio que ninguém gostaria de encontrar em mar aberto. Um navio amaldiçoado que causava infortúnios a quem cruzasse em seu caminho.

— Besteira Celso. Ainda mais se estiver falando do famoso Holandês Voador. Esse tipo de história todo mundo já ouviu, mas são meras lendas dos antigos navegantes para explicar coisas que ninguém entendia na época... principalmente os naufrágios. Pura desculpa de pessoas incompetentes.

— Eu sei, Senhor, mas... por precaução é bom passar longe daquilo ali.

— Muito bem, mande o piloto alterar a rota em 15 graus a noroeste, vamos nos aproximar mais da costa. Por precaução, como você disse.

A rota foi alterada, mas a rota das nuvens não. Continuava em direção ao navio em que Fernando e sua irmã trabalhavam. E dava a impressão de ter aumentado a velocidade.

Somente a tripulação na ponte e os dois irmãos haviam visto aquilo, o restante da tripulação e passageiros não tinham o menor o conhecimento do que estava acontecendo.

As nuvens se aproximaram com mais velocidade e de repente deu para perceber que realmente se tratava de um navio. Um galeão enorme, com mastros levantados, no entanto, as velas estavam todas rasgadas, e o próprio navio em péssimas condições, até mesmo de navegar. 

Mas o que verdadeiramente assustou Fernando, Nanda, e os membros da tripulação na ponte foi o que viram no convés daquele navio. Os tripulantes daquele navio eram esqueletos, ou melhor, nem todos, alguns era quase esqueletos, com alguma carne ainda em seu corpo, e se era possível um esqueleto sorrir, estes estavam sorrindo, e com espadas em suas mãos de puro osso. No timão estava um sujeito com cara de peixe, enorme, e uma de suas mãos era uma pinça de caranguejo. Na outra mão estava também empunhando uma espada.

Antes que pudessem fazer qualquer coisa, foram apanhados pela tempestade sombria, que os envolveu completamente.

A coisa foi toda muito rápida.

Quando Fernando e Nanda deram por si, o navio continuava a sua rota, o céu continuava limpo, em sua Lua Cheia, com poucas nuvens. E nem sinal das nuvens que os envolveram. Nem do galeão.

Terá sido uma alucinação?

O que os irmãos não sabiam é que o navio estava à deriva naquele momento, pois no interior da ponte, todos os membros da tripulação estavam mortos. Não havia ninguém pilotando o enorme navio.

E em seu caminho havia recifes...


FIM





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