VIAGEM LITERÁRIA
Olá meus amigos navegantes, intercalando com a biografia de autores nacionais e internacionais famosos e que todos nós gostamos, vou publicar uma série de contos sobre lendas marinhas, os quais também estão na plataforma Wattpad, e para a primeira publicação vem a história de uma família que mora próximo ao mar, sendo o pai um pescador e a mãe professora os quais tem uma filha que sempre se identificou com o mar. Há um segredo que quando ela completa seus dezoito anos será revelado e isso muda a vida de todos, para sempre. Aproveitem!
O
Presente do Mar.
Por Antonio H. Fernandes
“O mar não é
obstáculo: é caminho. ”
Amyr Klink
Laura era uma moça muito tímida, filha de uma
professora e de um pescador. Moravam em uma casinha simples, mas bem arrumada,
no litoral do Nordeste, em uma das praias mais isoladas e belas da região
Maranhense.
Como
não tinha muitos vizinhos, seu contato com pessoas se resumia à escola que
freqüentava, e a uma ou outra amiga que morava mais próximo à sua casa.
Laura tinha um verdadeiro fascínio pelo mar, e não
tinha como explicar tal fato. Quando não estava estudando ou ajudando em casa
nas tarefas, estava na praia, muitas vezes apenas sentada olhando para o mar.
Aquela imensidão fazia com que ela esquecesse de todo
o resto. Outras vezes ficava brincando e cantando enquanto as ondas iam e viam,
molhando seus pés e parte do seu vestido.
Sua mãe, Rosaura, sempre dizia que ela havia sido um
presente do mar, em atenção às suas preces, vez que não conseguia ter filhos,
por algum problema genético.
No entanto, muitas pessoas não acreditavam nisso,
achavam que havia sido sim, um milagre ou que o problema de Rosaura em
engravidar não era tão grave assim.
Fato era que Laura amava o mar, e parecia que era
recíproco, pois ela aprendera a nadar desde cedo e nunca teve nenhum problema,
como se afogar por exemplo. Algumas pessoas tinham a nítida impressão que o mar
ficava bem mais calmo quando ela estava na praia, se banhando. E, é claro,
alguns brincavam que o melhor dia para se tomar banho no mar era quando Laura estava
ali, junto com eles.
— Mãe, conta de novo como eu nasci. — Sempre
perguntava Laura à sua mãe, era sua história favorita para dormir.
— Bem, filha, eu estava triste, pois não conseguia
ficar grávida, e um dia, passeando pela praia, eu vi uma coisa vindo do mar,
bem longe. Parecia um pequeno barco ou até uma jangada, mas ao me aproximar
mais eu percebi que não era nenhum nem outro. Parecia uma cesta. Me assustei ao
ver o que tinha dentro. Nunca em minha vida eu imaginaria que dentro de uma
pequena cesta haveria uma linda garotinha que nem percebia onde estava. Dormia
o sono dos justos, ou dos anjinhos, como preferir. Era você, meu amor. Na mesma
hora, a tirei da cesta e corri para dentro de casa para mostrar ao seu pai, que
ficou tão emocionado quanto eu. Era o presente que eu tinha pedido todos esses
anos. Nós estávamos infelizes. Amávamos crianças e sofríamos porque não
tínhamos a nossa criança.
— Mas, mãe, então eu nasci do mar...
Olhando para aqueles olhos da mesma cor do mar, e um
sorriso que iluminava tudo, Laura respondeu com o mais afetuoso gesto de mãe.
Deu um beijo na testa de sua filha, e com lágrimas caindo em seu rosto, disse:
— Minha filha, você nasceu de mim, apenas o mar foi o
intermediário. Assim como as histórias de fadas, em que as cegonhas trazem os
bebes para os pais.
E era assim todas as noites. Mesmo sabendo como é a
história e como terminaria, Laura adorava que a mãe contasse essa história.
Enquanto ela crescia, algumas vezes acompanhava o pai
nas pescarias, depois das aulas. E, coincidência ou não, nessas oportunidades,
a pesca era sempre boa. Parecia que a menina sabia exatamente onde ficavam os
cardumes.
Tal fato chegou aos ouvidos dos outros pescadores que
ficaram logo com inveja, que logo passou quando Jânio convidou os outros a
pescarem juntos, assim teria peixe para todos.
Laura foi crescendo, mas uma coisa não mudou de jeito
nenhum. Todos os dias, ao entardecer, ela passeava pela praia, com o vento
balançando seus cabelos soltos e revoltos, o vestido molhado pelas ondas. E
sempre olhando para o mar. Como se tivesse vendo ou esperando alguma coisa
chegar.
E, em alguns momentos, ela parava e fixava o olhar,
como se tivesse realmente vendo algo...
Quando se formou, Laura era uma das meninas mais
bonitas da festa de formatura, disputada por todos os garotos da escola, o que
mexeu com o brio de muitas meninas. Acontece que a índole de Laura era tão doce
que nem as outras garotas ficavam com raiva dela, pois sabiam que ela nunca
agiria na traição com qualquer uma delas. E mesmo tendo até os mais belos
rapazes ao seu redor, Laura nunca demonstrou interesse por nenhum deles.
Quando perguntavam a ela o que ela queria fazer na
faculdade, a resposta era sempre a mesma: iria ser oceanógrafa. Amava o mar e
então ia viver dele. Ia cuidar dele.
Acontece que um pouco antes de Laura entrar para a
faculdade, apareceu um jovem na cidade, que se hospedou em uma pensão próxima a
casa de onde Laura e seus pais moravam.
Era uma pensão modesta, em que um casal de meia idade
mantinha para receber jovens que vinham de fora para estudar ou mesmo para
aproveitar as ondas das praias, que estavam entre as melhores do mundo.
Esse jovem era um surfista e todos os dias ia para a
praia pegar onda, bem próximo à casa dos pais de Laura.
E como ela não tinha perdido o hábito de passear todo
final de tarde na praia, percebeu que o jovem terminava de pegar onda, colocava
a prancha na praia e se sentava, envolvendo os braços nas pernas e ficava
encarando o mar.
Ele tinha o cabelo preto, mas a pele bem branca, não
aparentava uma pessoa que vive nas ondas, pegando sol, o que faria com que sua
pele fosse mais morena, mais bronzeada, e os olhos tão azuis como o de Laura.
A moça estava como que hipnotizada pelo rapaz, até que
um dia foi até ele e perguntou o seu nome e de onde ele era.
— Meu nome é Tristan, e eu venho de muito longe. Me
falaram muito dessa praia e eu vim conhecer pessoalmente. — E olhando bem nos
olhos de Laura, acrescentou: — Só não sabia que ia encontrar uma moça tão bela
e jovem. E que aparentemente ama o mar como eu.
Laura enrubesceu e baixou o seu olhar. Esse não foi o
primeiro galanteio que recebeu em sua vida, mas foi o que realmente afetou
mais. O rapaz mexia com ela... e isso era bastante embaraçador, pois não
entendia o motivo.
Tristan ia embora para a pensão e Laura ficava um
pouco mais, pensativa, e sem conseguir tirar o rapaz do pensamento.
Até que um dia, Tristan se declarou a Laura, disse que
a amava, e que tinha vindo de longe para tê-la como esposa e que a visitou em
todos os dias de sua vida.
— Como assim, me visitou... em todos os anos de minha
vida?! — Laura não acreditava no que estava ouvindo.
— Só apareci agora porque você está perto de completar
18 anos, faltam apenas alguns dias e quando esse dia chegar haverá algumas
mudanças em você. Por isso estou lhe falando agora, para não ser surpreendida e
reagir de forma assustada. — Afirmou Tristan.
— Mudanças? — Ela encarou Tristan, em nada
acreditando.
— Vou ser sincero com você, pois nada é mais forte e
libertador do que a verdade. Meu povo nunca mente, pois isso seria uma forma de
traição e não toleramos traições.
— Seu povo... — continuava incrédula.
— Laura, eu sou um Tritão. Ou como o povo da
superfície costuma chamar, uma sereia, só que macho. — Ao dizer essas palavras
o rapaz esperou alguns segundos para que Laura conseguisse entender e absorver
a informação. Ao ver que ela estava mais curiosa do que assustada ele
continuou:
— E você também é.
Nessa hora Laura arregalou os olhos e quase
desmaiou... Como assim ela era uma sereia? Não parecia em nada uma sereia, não
tinha uma cauda e nem membranas nas mãos.
— Os seus pais da superfície pediram com tanta vontade
que o pedido foi ouvido no meu mundo. E assim você foi ofertada a eles. O que
eles não sabem é que uma sereia só pode ficar no mundo da superfície até os 18
anos. Quando se completa essa idade é necessário o retorno ao Palácio de
Tritão, em homenagem a Poseidon, o Deus dos Mares. Quando se conhece a sua
verdadeira família. No seu caso, é o próprio Rei Tritão. Que mandou sua única
filha para ser cuidada e amada pelos pais superficianos. E realmente ficaram
muito alegres ao ver que o sentimento que sempre reinou em sua vida fosse o
amor.
Tristan continuou o seu relato, enquanto que Laura
sentou-se para não perder os sentidos. Mas cada palavra que o jovem dizia só
fazia sentido a ela. O fascínio pelo mar, o cheiro dos cardumes que sempre
achava para seu pai pescar, o fato de nenhum jovem da escola ou fora dela
chamar a sua atenção. No seu íntimo o mar sempre lhe chamou. Era questão de
tempo até ela aceitar. E agora...
— No dia que completar 18 anos, você receberá o
chamado de seu pai, inclusive ele mesmo virá te buscar. Mas não se preocupe.
Sua família superficiana não será abandonada. Sempre que puder poderá
visita-los. Só peço que não conte ainda a eles. Só no dia do seu aniversário
leve-os junto a você para receber o soberano.
Ainda atordoada, Laura voltou para sua casa. Parecia
loucura, mas muita coisa fazia sentido.
Exatamente no dia em que completou seus dezoito anos,
não teve festa, não teve recepção, nada. Ela apenas pediu que seus pais fossem
com ela até a praia, pois uma coisa diferente aconteceria.
Sem entender nada, Rosaura e Jânio seguiram sua amada
filha até a praia. Quando lá chegaram, Laura ouviu um sussurro, chamando seu
nome. Seus pais ouviam o barulho do vento e as ondas quebrando na praia. Era
quase uma melodia.
A noite se iniciava e ainda não estava escuro. Para
surpresa do trio, apareceu o jovem surfista, Tristan, no meio da água, onde a
onda quebrava... ele estava de pé, mas dava para perceber que a parte debaixo
dele não eram pés e sim uma cauda de peixe. Sua pele estava mais lisa e seus
olhos mais claros ainda. Naquele
instante apareceram duas figuras logo atrás de Tristan. Era o Rei e a Rainha do
Reino de Tritão.
Ele era alto, forte e tinha uma cabeleira preta, que
combinava com a barba grande e espessa que tinha. O seu ar era de autoridade.
Segurava um cajado na mão direita. Apesar de muitas histórias, não era um
tridente que ele usava. Em sua testa usava uma tiara dourada com pedras que
brilhavam muito.
A mulher ao lado dele era exuberante... longos cabelos
tão pretos quanto os do Rei, colo nu e cintura fina, com uma cauda dourada. E
sua Tiara era mais fina e delicada, mas igualmente dourada e brilhante. Todos
tinham os olhos claros.
Laura soltou as mãos de seus pais adotivos e foi até
seus pais verdadeiros. Assim que botou os pés na água começaram as mudanças.
Ela caiu e viu que suas pernas não estavam mais abaixo da cintura e sim uma
exuberante cauda de sereia, dourada como a de sua mãe, o vestido que usava foi
retirado e ela ficou nua da cintura para cima, com os cabelos soltos como ela
gostava. Seus olhos antes azuis como o céu agora estavam mais claros e ela
podia enxergar bem mais longe, além do que um ser humano conseguia enxergar. Em
suas mãos surgiram membranas que lembravam as dos peixes, com certeza para
ajudar na locomoção debaixo da água. Seus ouvidos ficaram mais sensíveis e ela
já podia ouvir tudo o que acontecia dentro do mar.
Os pais adotivos estavam perplexos, mas agora
entendiam de verdade que Laura era um presente e que durante dezoito anos
puderam criar e ensinar o que sabiam para a menina que agora, na sua frente, se
transformava em uma linda sereia.
Eles tinham que ir embora, e então se despediram dos
superficianos, prometendo voltar outras vezes para fazer uma visita.
Segundo as leis do mar, as sereis podiam ficar um dia
por mês em terra firme, e esse dia seria usado para visitar Jânio e Rosaura.
Dois anos depois, após alguns meses sem visitar, e já
preocupados, pois não tinham nenhuma notícia de sua filha sereia, Laura
retornou trazendo a seus pais uma novidade. Era um pequeno tritão, seu filho
com Tristan e que assim como ela, eles deixariam o pequeno para ser criado
pelos avós, que ficaram muito felizes e emocionados com esse gesto de confiança
e amor.
FIM
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